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✮ O Sentido do Sentido ➤ [Reyesvalenciennes Nª 254]

Reyesvalenciennes 2020
✮  O Sentido do Sentido ➤ [Reyesvalenciennes Nª  254]



[Texto do Dia]→   Conta-se que o filósofo britânico Bertrand Russel (1872-1970) que não acreditava em Deus e foi um dos pensadores mais importantes do século XX, permaneceu calado quando certa vez um taxista lhe perguntou qual é o sentido da vida. Como explicar esse silêncio de Russell? Será que ele, que havia lecionado em universidades na Inglaterra , nos Estados Unidos e na China , escrito vários livros de Filosofia e recebido o prêmio  Nobel de literatura , não tinha nada a dizer? Talvez . Mas é mais provável que a resposta teria sido tão longa e tão complexa que , naquele momento, Russell preferiu não dizer nada. Em outra ocasião , esse mesmo filósofo , interrogado novamente sobre o significado da vida , teria dito: "EU tendo a responder a essa pergunta com outra pergunta: qual é o significado do 'significado da vida'?" (Apud Lawhead , William F. The Philosophical journey : an interactive approach. New York : McGraw Hill , 2010 .p.644. Tradução do autor.) Embora Russel , em alguns de seus escritos , tenha se esforçado para entender a existência humana em um mundo aparentemente absurdo , para alguns filósofos a questão sobre o sentido da vida não faz sentido. Para eles , há algumas questões que fazem sentido e outras, não. Perguntar , por exemplo , "Que horas são agora em Pequim?" faz sentido , pois se pode esperar uma resposta determinada , mas perguntar "Que horas são agora no Sol?" , pelo contrário , não faz sentido , pois somente atribuímos fusos horários para a Terra , e não para o Sol. Seguindo esse raciocínio , faz sentido perguntar sobre o significado de um símbolo matemático ou de um sinal de trânsito , mas , quando perguntamos o que significa a vida humana , as respostas são sempre confusas e incoerentes porque , segundo esses filósofos , a própria pergunta não faz sentido. No Tractatus Logico Philosophicus , um livro muito influente e 1921 , o filósofo austríaco Ludwig Wittgenstein se expressou da seguinte forma em relação ao "enigma da vida":

"Observa-se a solução dos problemas da vida no desaparecimento desses problemas. (Esta não é a razão por que os homens , para os quais o sentido da vida se tornou claro depois de um longo duvidar , não podem mais dizer em que consiste esse sentido?) Existe com certeza o indizível . Isto se mostra , é o que é místico. O método correto em filosofia  seria propriamente : nada dizer a não ser o que pode ser dito , isto é , proposições das ciências naturais -algo , portanto , que nada tem a ver com a filosofia ; e sempre que alguém quisesse dizer algo a respeito da metafísica , demonstrar-lhe que não conferiu denotação a certos signos de suas proposições. Para outrem esse método não seria satisfatório - ele não teria o sentimento de que lhe estaríamos ensinando filosofia - mas seria o único método estritamente correto. Minhas proposições se elucidam do seguinte modo: quem me entende , por fim as reconhecerá como absurdas , quando graças a elas - por elas - tiver escalado para além delas. (É preciso por assim dizer fora a escada depois de ter subido por ela.) Deve-se vencer essas proposições para ver o mundo corretamente. O que não se pode falar deve-se calar."

-Wittgenstein , Ludwig. Tractatus logico-philosophicus. São Paulo : ED. Nacional/ Edusp, 1968.p.129.

Em outras palavras , a solução do problema seria deixar de fazer pergunta! Nessa obra , Wittgenstein partia do pressuposto de que a linguagem só poderia expressar aquilo que pudesse ser comprovado ou refutado por meio da experiência. Porém , as proposições que dizem respeito ao propósito , ao valor , à coerência e à inteligibilidade da vida humana podem ser verificadas mais pela especulação do que pelos fatos. Então , do ponto de vista de Wittgenstein , a própria questão a respeito do sentido da vida deveria ser evitada , pois , de acordo com esse autor , ela seria "vazia" de significado.  Mas nem todos os filósofos concordam com Wittgenstein , posteriormente , já não concordava mais com o que tinha escrito na obra Tractatus Logico-Philosophicus . Assim , a busca pelo sentido da vida continua sendo um importante tema de reflexão filosófica. De modo geral , podemos pensar que as diferentes respostas a essa questão podem ser comparadas à montagem de um quebra-cabeça ou à produção de um mosaico. Imagine que você esteja montando um quebra-cabeça e tenha nas mãos uma peça azul. Na imagem a ser formada , ela pode ser um pedaço do céu , do oceano ou mesmo de uma parede azul. Como saber? Uma das possíveis maneiras é compará-la com a imagem da caixa em que vieram as peças. De forma parecida , para muitos filósofos , é possível responder à questão do sentido da vida juntando ideias em busca de uma resposta que , se adequadamente formulada e entendida , deveria ser aceita por todo . Assim como a imagem de um quebra-cabeça montado é sempre a mesma , não importa quem o monte , também a "verdade" a respeito do sentido da vida seria uma só , independentemente de a conhecermos ou não. Mas há ainda outra forma de interpretar a solução do problema do sentido da vida . É possível também compará-la com um mosaico , que é uma imagem formada pela composição de pedrinhas coloridas. A partir de um mesmo conjunto de pedrinhas , é possível compor inúmeras figuras diferentes.  De modo análogo , para muitos filosóficos , o sentido da vida não seria "objetivo" , isto é, não seria o mesmo para todos. Pelo contrário , cada um de nós encontraria ou fabricada um conjunto de valores , conhecimentos e convicções que daria sentido à vida. Há ainda outra possibilidade : a recusa em aceitar que a vida faça qualquer sentido. Não se trata , como Wittgenstein escreveu em seu Tractatus logico-philosophicus , de negar a possibilidade de pensar filosoficamente a respeito da vida humana. Trata-se , sim , de reconhecer que a vida humana não passa de um absurdo , que ela não tem sentido algum a ser descoberto ou mesmo a ser inventado . Trata-se de acreditar que o ser humano vive em direção ao nada , que é a morte , e que , portanto , nada faz sentido. Esse posicionamento filosófico é conhecido como niilismo.

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