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[TEXTO DO DIA]→  A agenda política pautava-se agora nas eleições presidenciais ,
marcadas para outubro de 1955, agrupados, os herdeiros do getulismo
lançaram a candidatura de Juscelino Kubitscheck , governador de Minas
Gerais pelo PSD , à presidência da República , tendo como vice o
ex-ministro do Trabalho João Goulart , do PTB. A UDN indicou o general
Juarez Távora . Ademar de Barros , pelo PSP , e Plínio Salgado , pelo
PRP , completavam o quadro dos candidatos.  A composição PSD-PTB era
praticamente imbatível. Reunia as massas urbanas  e representantes das
oligarquias regionais.  Agrupava as classes médias , setores da
burguesia (industrial, agrária e comercial) e sindicalistas. Formava
uma "frente nacional" que tinha como programa a expansão da indústria
brasileira , reunindo os dois conceitos chave do período ,
nacionalismo e desenvolvimento. Mesmo assim, as eleições de 1955 foram
as mais disputadas de todo o período populista. Juscelino alcançou 36%
dos votos , contra 30% de Távora , 26% de Ademar e 8% de Plínio
Salgado. A UDN praticamente mantinha os mesmos índices da eleição de
1950. Ademar e Plínio fizeram a diferença. O governo de Juscelino
Kubitscheck (1956-1961) coincidiu com um período de otimismo e euforia
jamis visto  na história brasileira. Apoiado em uma visão de
modernidade industrializante , o novo presidente prometia 50 anos de
desenvolvimento em seus cinco anos de mandato. Escadas rolantes ,
elevadores com música ambiente, televisores , rádio de pilha ,
lambretes , automóveis formavam os símbolos de uma geração inebriada
com o conforto da vida moderna.  Novas molduras , propiciadas pela
tecnologia , enquadravam as ruidosas massas urbanas . Majestosos
cinemas exibiam as produções hollywoodianas e filmes das duas grandes
companhias do país, a Atlântida e Vera Cruz. Grandes estádios
abrigavam milhares de torcedores numa das fases mais entusiásticas do
futebol brasileiro. Largas avenidas tornavam-se passarelas de
desfiles de carnaval , de manifestações e comemorações públicas , ao
mesmo tempo que constituíam espaço de diferenciação do coletivo , que
circulava a pé , de ônibus ou bonde , e do individual, dos automóveis
" do chuá"  e das lambretas "bárbaras". Acima de todas as possíveis
molduras , emergia na vida cotidiana a pequena tela da televisão , que
enquadrava as massas no interior de suas casas e no núcleo familiar.
Com programações ao vivo , shows de calouros, concursos de misses ,
provas de conhecimento e, principalmente , novelas, a televisão
alterou o comportamento de milhares de brasileiros e tornou-se o bem
de consumo  mais cobiçado do país. Diante da telinha mágica , a massa
permanecia público.  Por conta de todas essas transformações , mas
também pelas condições políticas , pode-se considerar a segunda metade
da década de 1950 como o auge do regime populista. Apesar de algumas
escaramuças militares e da mobilização dos trabalhadores urbanos e
rurais , o governo de Juscelino conseguiu conviver com setores
antagônicos,  amortecer os setores golpistas e suportar as pressões
populares. Os militares foram agraciados com atenção especial. Tiveram
suas reivindicações particulares atendidas e assumiram importantes
postos no governo. O movimento sindical manteve-se sob o controle do
governo . E a aliança PSD-PTB significou uma afinada parceria.  Apesar
da euforia e da fina sintonia política , o entusiasmo modernizador
encobria uma série de contrastes e ambiguidades. Época de afirmação
dos valores nacionais , concretizada nas vitórias esportivas -
principalmente a Copa do Mundo de Futebol de 1958 - e na produção
cultural e artística , que criticava as influências estrangeiras, o
período JK foi também marcado pela assimilação e imitação de
comportamentos  norte-americanos introduzidos numa avalancha no país.
A juventude transviada de James Dean , Chuck Berry, Elvis Presley  e
Jerry Lee Lewis , que ouvia rock-n-roll , apostava corridas de
automóvel , sonhava com Marily Monroe , usava Blue Jean e jaquetas de
couro , odiava política , consumia álcool e envolvia-se com frequência
em brigas de turmas , invadia com seus símbolos as ruas , praças e
avenidas do nosso país tropical.  Havia , sobretudo nas cidades , um
precário equilíbrio de valores morais. Enchimento - entre as "sérias"
e as "sem-vergonha" . As primeiras , esposas que em geral casavam
virgens , cuidavam da educação dos filhos e das roupas dos maridos. As
segundas , dançarinas e vegetes , que ofereciam tratamento de luxo aos
seus seletos convidados : roupas íntimas pretas , perfume francês ,
campanha Moêt Chandon e Abaur Lilás , como fazia a célebre vedete
Angelita Martinez , tida como amante do vice-presidente João Goulart e
do jogador de futebol Mané Garrincha . Entre as amantes e as sérias , havia as separadas e desquitadas , que
povoavam as fantasias dos conquistadores e era motivo de vergonha e
constrangimentos para as famílias de bem. A rígida moral não resistia
ao carnaval. Nos recatados bailes de salão, a classe média alta
apartava-se do convício com os grupos subalternos , mas ouvia as
marchas e sambas produzidos nos morros cariocas , permitindo-se roupas
e rebolados mais ousados , máscaras e farto consumo de lança-perfume .
Nas ruas , sem as molduras dos salões , a massa ruidosa subvertia por
alguns dias a hierarquia social, ocupando o espaço público sem
pudores. Ao pé dos morros e nas vielas , a malandragem de terno e
navalha vivia se carnaval o ano inteiro. Numa época em que se presumia
que as aparências não enganavam , mulher honesta não podia fumar em
público, usar calça cumprida ou entrar num cinema desacompanhada; o
homem era obrigado a demonstrar sua valentia e proteger as damas de
quaisquer grosserias; os filhos deviam manter-se respeitosos aos pais,
mesmo diante de suas maiores arbitrariedades; o uso de uma camisa
lilás ou rosa por um homem não deixava dúvidas : tratava-se de um
"mandraque". Tempos de maniqueísmo , de inconciliáveis oposições , de
afirmação do bem contra o mal. Também nos cotidianos vivia-se a Guerra
Fria.

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